Chapelada!
Custa-me sempre ver benfiquistas de boa formação defenderem, tenho a certeza que sem hipocrisia, posições que os factos e outras evidências implícitas, inequivocamente desmentem.
Tenho-me perguntado porquê?
É verdade que a primeira fundamentação deve ser procurada na transfiguração emocional que o futebol proporciona. E aí penso que não há nada a fazer.
Mas julgo que, logo a seguir, vem a propensão que nós demonstramos para aceitar tudo o que está institucionalizado. Os portugueses sentem-se, por exemplo, republicanos, não porque tenham escolhido algum dia entre monarquia ou república, ou sequer porque tenham pensado muito nisso (os que pensam nisso correm o risco de ter surpresas). Os portugueses sentem-se republicanos porque nasceram em república, ponto. Porque é esse o regime instituído ao qual sentem obrigação de aderir.
E este é um dos nossos problemas. Fomos educados por um Estado assistencialista a cujas instituições entregamos boa parte do nosso destino. Não sentimos o apelo da cidadania nem a responsabilidade da participação cívica.
No Benfica também é assim, sentimo-nos uma espécie de traidores quando por algum motivo exercemos a critica interna. É mais fácil chamar “portista ou papagaio” ao que critica o clube, do que reconhecer que a critica pode ter o sentido positivo da correcção e da mudança. Foi nesta subserviência institucional que sobreviveram durante largos anos alguns dos “Vale e Azevedos” que o Benfica tem promovido nas décadas mais recentes.
Factos são que o Benfica perdeu nos últimos 20-30 anos a hegemonia do futebol português. E não soube ainda reagir porque contemporiza de tal forma com a mediocridade que acha normal não passar do terceiro lugar há já quatro anos. Prefere aderir e defender irracionalmente o que está, do que admitir que o seu clube não é o melhor, como os factos infelizmente comprovam.
Vem tudo isto a propósito da chapelada dada pela actual direcção do Benfica no caso das próximas eleições.
Estou à vontade porque fui o primeiro a defender neste blog as eleições antecipadas. No seu devido tempo e com a única justificação que existia. Juntar um projecto à responsabilidade de o conduzir e coordenar na próxima época. Para não termos, uma vez mais, um Benfica adiado, onde a culpa morre sempre solteira.
A Direcção do Benfica e seus apaniguados defenderam-se na” sacrosantidade” dos Estatutos que há tantos anos propunham aquele mês eleitoral e que não deviam ser manipulados para servir os interesses do que quer que fosse (mesmo do Benfica, percebi então).
Com este pudor legalista a Direcção do Benfica tratou de despedir quem entendeu e de contratar quem considerou conveniente.
E agora que tudo está devidamente armadilhado, a Direcção do Benfica (com o aplauso dos mesmos apaniguados!!!) tira da cartola uma manobra que provoca a antecipação das eleições, pervertendo gravemente o espírito dos mesmos Estatutos que com tanta piedade defendia.
Ou, falando seriamente, alguém acha que a Direcção se demitiu para outra coisa que não para tornear habilidosamente os Estatutos, quando vê crescer as oposições internas?
Antes se tivesse demitido, como devia, pelo medíocre desempenho que tem tido que afundou o Benfica desportivamente e agora (não há milagres) até financeiramente.
Por isso é mais do que apropriado falar em “golpe de Estado” dos Estatutos. Ou porque, neste caso, os protagonistas são medíocres, meramente em “chapelada”.
Agora sim, é caso para dizer que caiu a máscara a uma Direcção que usa os mesmos métodos dos adversários que tanto condena. E que mostra um apego ao poder verdadeiramente insuportável para o desempenho que tem tido e para a responsabilidade que tem demonstrado.
Está na hora dos Benfiquistas acordarem e perceberem o carácter de quem os tem conduzido a este "esplendor" desportivo e de credibilidade em que infelizmente hoje vivemos.
António de Souza-Cardoso
PS2. Rui Costa permanece calado. Julgo que se trata do “silêncio dos inocentes”. Percebo que para o Rui, apesar de todos os destemperos, não seja fácil resistir ao parasitismo que o ainda Presidente do Benfica exerce sobre o seu nome e a sua glória. Mas valerá a pena?